
O mês de novembro se apresentou como um momento de transição, em que a economia passa a oferecer clareza suficiente sobre o presente, permitindo que o mercado comece a olhar adiante com mais precisão.
Depois de um período marcado por incertezas, interrupções de dados e volatilidade na interpretação do ciclo, novembro consolidou informações importantes e abriu espaço para testar caminhos possíveis da política monetária e da trajetória macroeconômica.
Nos Estados Unidos, esse movimento ficou evidente com o fim do shutdown que havia limitado a divulgação de indicadores essenciais. A retomada dos dados permitiu uma visão mais clara da dinâmica econômica.
O PPI de setembro trouxe variação de 0,3% no índice cheio e de apenas 0,1% no núcleo — implicando um núcleo do PCE em torno de 2,8% anualizados, sinal de que as pressões inflacionárias seguem arrefecendo.
A atividade doméstica também mostrou sinais de moderação: as vendas no varejo subiram 0,3% no mês, abaixo da expectativa, e o grupo de controle caiu 0,1%, apontando para um consumidor mais cauteloso. No mercado de trabalho, o ADP mostrou criação de 42 mil vagas, porém em ritmo modesto, sugerindo um arrefecimento gradual da demanda por mão de obra.
O Payroll reforçou essa leitura: foram criadas 119 mil vagas em setembro, abaixo das expectativas do mercado, ao mesmo tempo em que a taxa de desemprego avançou para 4,4% e o crescimento salarial desacelerou para 3,8% — níveis compatíveis com um mercado de trabalho menos pressionado e com menor risco inflacionário.
Assim, novembro não trouxe ruptura, mas consolidou a percepção de que a economia americana se desloca para uma fase de desaceleração gradual, suficiente para alimentar o debate sobre flexibilização monetária, embora ainda sob divergências internas no Federal Reserve.
No Brasil, novembro também marcou a transição entre o diagnóstico do presente e a abertura de debates mais amplos sobre o futuro da política monetária. O IPCA cheio reforçou essa dinâmica de convergência: a inflação oficial de outubro registrou alta de 0,09%, bem abaixo da taxa de setembro (0,48%) e inferior ao que projetava o mercado (0,15%). Em 12 meses, o índice recuou para 4,68%, ante 5,17% no período imediatamente anterior — a menor taxa para o mês desde 1998.
Essa leitura historicamente benigna foi acompanhada por alívio contínuo em alimentos, estabilidade nos preços administrados e menor pressão em serviços subjacentes, contribuindo para a ancoragem das expectativas.
Já o IPCA-15 avançou 0,20% no mês, e o índice acumulado em 12 meses desacelerou de 4,94% para 4,50%, reforçando a tendência de desinflação. A composição foi amplamente favorável: alimentos em deflação pelo sexto mês consecutivo, administrados estáveis diante da queda de energia elétrica e gasolina, núcleos bem-comportados e serviços subjacentes em processo contínuo de acomodação. O único vetor de pressão permaneceu nos serviços intensivos de mão de obra, que aceleraram marginalmente.
A atividade econômica também mostrou perda de fôlego compatível com um ambiente de juros elevados: a produção industrial cresceu 0,1% em outubro, abaixo do esperado, e o CAGED registrou criação de 85,1 mil vagas formais, também aquém das projeções. Ainda assim, a taxa de desemprego recuou para 5,7%, embora influenciada por queda relevante na participação da força de trabalho.
Essa combinação — inflação convergindo, atividade arrefecendo e expectativas mais bem ancoradas — reforça que a atual taxa Selic opera acima do nível consistente com os fundamentos macroeconômicos até aqui apresentados. Em outras palavras, o juro real se mantém excessivamente contracionista para a fotografia econômica atual.
É esse desalinhamento que sinaliza, com crescente clareza, que estamos entrando em um ponto de transição da política monetária, no qual a discussão deixa de ser sobre aperto e passa a ser sobre o momento adequado para flexibilizar.
Foi justamente essa consolidação do cenário que abriu espaço para o mercado começar a testar possibilidades mais amplas para 2026. A comunicação recente das autoridades monetárias afastou a possibilidade de alta de juros como cenário base, e o mercado passou a atribuir probabilidade superior a 90% a um corte de 25 pontos-base já na primeira reunião do próximo ano.
A curva de juros incorporou aproximadamente 300 pontos-base de flexibilização ao longo de 2026, enquanto as projeções para a Selic em 2026 e 2028 foram revisadas para baixo. Com isso, novembro se tornou um ponto de inflexão: o debate deixou de se orientar apenas pela fotografia do presente e passou a incorporar, de maneira estruturada, a discussão sobre o ritmo e a profundidade do ciclo de afrouxamento.
Pela primeira vez em muitos meses, o quadro macroeconômico apresentou consistência suficiente para que o mercado deixasse de atuar à sombra da incerteza imediata e passasse a trabalhar em terreno de possibilidades. O presente deixou de ser apenas observado e passou a ser interpretado — e, a partir dessa interpretação, tornou-se possível projetar futuros alternativos.
Novembro não encerra nenhum ciclo, mas redesenha o mapa sobre o qual as próximas decisões serão tomadas. É um mês que sinaliza que o diagnóstico está mais claro e que, por isso mesmo, o futuro pode, enfim, começar a ser desenhado.










